domingo, 6 de julho de 2008

Cadê os Botequins?

Um segundo lugar de aconchego, o botequim tinha personalidade e o seu dono exercia vários papeis, dependendo do grau de amizade com o cliente. Era, praticamente, uma instituição no bairro ou no centro da cidade, para onde convergiam pessoas de diversas classes sociais, em busca de um local de lazer.
Seu ambiente com inhaca de uso, de suor humano, de cerveja e, dependendo do local, de xixi, não era empecilho para uma freqüência de peso, em horários de pico, como próximo à hora do almoço e no final da tarde. Ali, resolviam-se todos os tipos de problemas, desde o comezinho cotidiano das brigas e intrigas domésticas, até aos problemas do Estado, despachando-se processos importantes das repartições públicas ou juizes e desembargadores proferindo sentenças, com a papelada sobre os joelhos, para não molhar sobre a mesa.
Dependendo da fama do botequim havia uma espécie de código de ética não escrito, seguido à risca, principalmente, no que dizia respeito ao pagamento das bebidas e tira-gostos, existindo o caderno das anotações das dívidas, para aqueles que chegavam ao grau de obter crédito na casa. Essa hierarquia dentro dos botequins tinha critérios muito subjetivos, seguidos pelo dono, tendo como base, em geral, a constância do freguês ao freqüentar o ambiente, seu grau de importância pelo cargo que exercia no poder constituído, sua sociabilidade em relação a seus colegas de botequim ou sua influência lá fora.
Uma coisa importante é que o verdadeiro botequim não se confundia, simplesmente, com um bar qualquer, nem se reduzia a um lugar de vender bebida alcoólica a quem chegasse. Era muito mais, tinha toda uma ambiência cercada de uma aura solene, fazendo com que nem todos pudessem se abancar em suas mesas e tomar sua cerveja, como em qualquer bar.
Havia os botequins de bairros e ainda existem, mas desprovidos desse “quantun”, desse envolvimento emocional de seus fregueses, de certa intelectualidade produtiva e atuante na cidade, de um diferenciador qualitativo onde se encontrava a nata social da localidade. Além disso, o ambiente físico não era decadente e improvisado e tinha suas mordomias, com boas acomodações e produtos de qualidade.
Isso desapareceu. E, sem nenhum conteúdo nostálgico, há a lembrança dessa época dourada, brilhando nos corações e nas mentes, que está sendo substituída por franquias desodorizadas e pasteurizadas, onde o único objetivo é vender seus produtos. A freguesia insossa de yuppies com suas famílias modernosas vêm tomando conta desse lugares, com parques de diversões para crianças, deixando de lado grupos sociais que questionavam, que estudavam a fundo os clássicos e constituíam a intelectualidade da cidade
Em cidades como o Rio de Janeiro e São Paulo esse fenômeno dos botequins há tempos vem desaparecendo. Ficaram, apenas, os bares de luxo ou as quitandas dos bairros mais desfavorecidos, financeiramente, onde ainda se fazem música ao vivo, não como shows, mas em tempo integral, como se quisessem matar as conversas interessantes. E foram-se os botequins e ficaram nada...

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